Caminho das Índias

Um email com fotos de Varanasi, na Índia, circula por aí. Ora as pessoas atribuem a miséria à colonização britânica, ora difamam a religião hinduísta. Em um dos que recebi estava bem assim:

"Caso alguém queira ir à Índia, aqui estão algumas fotos tiradas recentemente por um cliente ... uma cultura muito, muito antiga espera por vocês... bom tempo, água limpa e lugares maravilhosos para banhar-se*. Porém é proibido um cristao ser batizado, lá é crime de morte "

* Ironia

Gente, o que foi isso ???

Sim ! Assim como o Rio não é só o Maracanã , Corcovado , Pão de Açucar e Ipanema - o que mostram na novela- a Índia não é só Taj Mahal, lindos saris, deliciosas frutas e palácios imponentes. E isso não a torna menos do que o Brasil, torna ?
Para mim, é difícil fazer essa crítica simplista de fome, miséria e mazela. O que essas fotos retratam tem a ver com fé tb! Mto maior do que a de muitos de nós! Ali, naquelas ghats de cremação , tb estão os corpos de mortos de alta casta . Apenas com a diferença de altura, qualidade da madeira e existência de essência de eucalipto. É cultural e religioso. De fato, a mesma água em que são jogadas as cinzas dos mortos (as cremações nunca são interrompidas) serve para banhos de purificação. E novamente não há distinção entre ricos e pobres, feios e bonitos, castas e raças. Os portões estão aberto a todos - há quem aproveite para tomar banho mesmo, de xampu e sabonete. Ou seja, rico também está ali !!!
Além dessa atmosfera que foi mostrada nas fotos, ainda tem uma casa onde os idosos e doentes moram para que já estejam ali na hora da morte. E se consideram privilegiados por isso porque eles acreditam que se tiverem suas cinzas atiradas no rio alcançarão o nirvana e terminarão o ciclo de encarnações na Terra. O desapego material é tanto que, assim que percebem que vão morrer, largam casa e família e se mudam para lá . Pra vcs terem uma ideia ( já na nova regra gramatical, SEM ACENTO) entre 4 mil e 5 mil peregrinos chegam a Varanasi diariamente !!!
Pude presenciar alguns rituais e chega a ser comovente e apaixonante! Os corpos vão descendo um a um em macas de bambu: homens são enrolados em tecido branco, mulheres em vermelho, idosos em roxo. E centenas de turistas em volta. Surpresos e sérios. Há um barbeiro que raspa a cabeça dos filhos do morto com "higiene ocidental" nenhuma. Mulheres não podem ficar perto porque elas são mais sensíveis e, se chorarem, prendem a alma da pessoa que fica vagando por aqui. O filho mais velho acende o fogo. Vai queimando o pano que envolve, queimando ...até que horas depois as cinzas são jogadas no rio Ganges. Não são cremadas crianças de até 5 anos, brâmanes, mulheres grávidas, pessoas que morreram mordidas por cobra, de hanseníase ou varíola. Não se cremam animais. Todos esses são jogados no rio com uma pedra amarrada. Os iogues também não. Eles supostamente atingem o nirvana na Terra mesmo.
Aqueles corpos boiando, como foram mostrados de forma até desrespeitosa, talvez sejam resultado do desprendimento da pedra ou sei lá o que. Não vi nenhum. Porém, em poucos metros vc chega na ghat principal , onde todos os dias (no nascer e no pôr-do-sol) é realizada a cerimônia de oferenda à deusa Ganga, de onde deriva o nome do rio. Sete sacerdotes (somente brâmanes, a casta superior) participam do ritual, entoam mantras e oferecem doces de açúcar e leite para a multidão. Festa e morte ; lado a lado.
Como vocês podem ver, há todo um conceito muito diferente do nosso que faz o lugar ser ao mesmo tempo extremamente espiritual e ser um hospital a céu aberto, com doentes espalhados pelas 64 ghats , em 7 quilômetros.
Isso pra me deter ao hinduísmo pq se vc afastar 10 km do rio, vc já está na parte sagrada para os budistas. Asfalto, silêncio...onde o primeiro sermão de Buda foi feito para cinco discípulos e se originou o budismo. A Stupa , um monumento tipicamente budista, é imponente ! Alguns seguidores caminham em volta da stupa, entoando mantras e preces. Essa parte foi engraçada pq uma turma de colégio inteira pediu pra tirar foto comigo !
Bom, independente do choque que as pessoas possam ter vendo o email com as fotos, é legal ver que essa informação que tanto me fascinou e me fez querer ir lá ver, de certa forma chegou a curiosidade de todos. ( e eu não sou mais a toda diferente ! hahah) Espero que , com o tempo, tenha-se menos olhar de preconceito e sim o da multiplicidade que é o mundo.
A Índia não tem MESMO a beleza clichê nos Alpes Suíços ou dos mares do Caribe. Mas ela é absurdamente fascinante e transformadora ! Sem falar nas maravilhas menos polêmicas e unânimes como o Taj Mahal , templos lindos, pessoas puras e SEGURANÇA ! Com tanta pobreza e caos vc não tem violência !!! Tem noção ???
Temos muito o que aprender com eles. E que a Globo deixe claro isso tb! ( e de quebra, vc pode voltar acreditando mais ainda em Deus...)

Obama X Bush

Não! Eu não quero colocar água nesse feijão. Tão pouco diminuir a beleza da vitória da democracia ou o jato de esperança que surgiu com a posse de Obama.
Eu só quero externalizar uma dúvida genuína. Idiota talvez. Mas nem só de dúvidas transformadoras vive essa pessoa que vos escreve...
Então...
Todos estão dizendo que não terão saudades do Bush. Que ele foi o pior presidente dos últmos tempos e degradou não só a economia do país como sua relação com o mundo. Querem esquecer os últimos 8 anos.
Ok... se eles querem esquecer, eu respeito. Mas a dúvida que persiste é : a reeleição foi democrática , não foi ? Vimos o governo de Bush em 4 anos e eles quiseram de novo; quiseram mais.
Sei lá! É que eu acho que , em algum momento, os estadunidenses têm que assumir os seus erros e prepotência diante do mundo ( e paga-se por isso !), repensar seu jeito de encarar sua relação com os demais e perceber, enfim, que é mais fácil esquecer 4 do que 8 anos de escolhas mal feitas ...

Quando faltam palavras...

Quando faltam palavras...


... e sobram dúvidas e comoção ...

Impressões da Bahia

Havia um pouco mais de 5 anos qu´eu estivera em Caravelas , Abrolhos, Arraial D´Ajuda , Porto Seguro, Caraíva, Trancoso e sua linda praia do Espelho. Nesse fim de ano fiz minha segunda viagem para a Bahia. Um estado cheio de personalidade.

Até então fui com algumas leituras, dicas garimpadas na internet e opiniões de amigos e familiares. "Salvador é suja" , " baiano se acha" , " as praias da capital não são lá essas coisas", "vc vai gostar", "cuidado com o pelourinho, lá é perigoso" , " a vibe é uma delícia", "os vendedores ambulantes não te deixarão em paz". Enfim, opiniões diversas como diversas são as percepções de cada ser humano. Aliás acredito muito nisso. E vai além: podemos ir várias vezes em um lugar e sair com impressões diferentes simplesmente porque elas são produtos de nosso estado de humor, amor, encontros, desencontros, clima e situações ...

E lá estive por uma semana. Começei em Salvador e, de cara, pelas praias. E as achei lindas ! Os coqueiros do Jardim de Alah , a praia do Flamengo...ah a praia do Flamengo ! Belas boas vindas!

Final da tarde fora a vez do Pelourinho. Táxi ? Não... ônibus (R$2,15)mesmo...afinal, era logo ali...

Igrejas, prédios públicos, artistas de rua, capoeira e os tais vendedores ambulantes. Curiosamente os achei parte daquilo tudo. Sempre amistosos e desejando boas festas, eles ofereciam as fitinhas do Senhor do Bonfim exatamente como me disseram... "Não aceita que vc terá q pagar depois" . Era verdade mesmo. Mas era só dizer " Não, obrigada" que eles sorriam e agradeciam. Simples assim.

Eu e Talita descemos o elevador Lacerda e fomos ao mercado Modelo. Comprei uma lembracinha e logo já estávamos lá em cima novamente para conhecer o Terreiro de Jesus e suas redondezas. Depois, voltamos para o hotel.

No outro dia, bem cedo, partimos para Mata de São João. Pegamos novamente um ônibus que nos deixara na rodoviária (R$2,00) e depois uma Sprinter de uma cooperativa que fazia o trajeto por R$7,00. Uma hora e meia depois estávamos na famosa praia do Forte com seu projeto TAMAR. Adorei o lugar e sua estrutura. R$10,00 para entrar. A ruela principal da cidade é um charme só. Com pousadas , lojas e restaurantes por toda a sua extensão, é um lugar para passear e descansar ...

Lá comemos uma moqueca de camarão dos deuses! E o suco de manga era outra preciosidade! Não lembro o nome do restaurante mas era italiano !

A praia de Papa- Gente é linda. Recomendo ir lá primeiro e deixar o projeto TAMAR para a parte da tarde, quando tem alimentação das turtles !

Voltamos para Salvador às 17h. Mas antes, uma pausa para um bate papo com um conhecido de Volta Redonda! Acreditam ?!?!

Nos três dias que se seguiram, exploramos Morro de SP. Nem preciso dizer que amamos! Destaque para o pôr do sol na Toca do Morcego, passeio Boipeba Plus , vista do Farol e 3 e 4 ªs praias ! Fomos de catamarã (R$70,00) que leva duas horas de viagem e voltamos de baldeação ( R$5,00 de barco até o atracadouro + ônibus até a polícia ; R$10,80 de ônibus do posto policial até o Ferry de Itaparica e R$3,35 o ferry até Salvador) totalizando 4h30.

Nesse mesmo dia que regressamos, como era uma terça, resolvemos ir na terça da bênção no pelourinho. Ator global, gente local e mto, mto gringo! rs...

Último dia , pelourinho de novo! Dessa vez pela manhã para vermos lojinhas, igrejas e tudo mais! A nostalgia começou ... já estava ficando com saudades!

À noite, réveillon ! Hora de celebrar a vida e a oportunidade mais uma vez concedida a essa pobre mortal!

Dia 01/01 chegou e, com ele, a hora de partir. Entramos no avião e eu sentei ao lado de um negrão com dread na cabeça e cordões no pescoço. Logo já estou batendo papo com Paulo Porto. Disse ter sido integrante do Olodum. Agora, morava em Curitiba e lá buscava seu lugar ao sol com a banda de Reggae Rhammisá. (lugar de sol não é a Bahia ?)

Chegando ao Rio, despedi-me de Paulo, desci do avião , dei até logo a Talita e fui refletindo frescão a fora...

Minhas impressões ? Concordei com Vinícius que passar uma tarde em Itapuã pode ser uma ótima. E assim como João Gilberto, que saudade tenho da Bahia !

Mulher Independente - Martha Medeiros

Estava ali...jogada em cima da mesa de Clá.
Peguei. Li. Ri.
Não, não era cômica . Mas rir foi a minha reação ao ler a opinião de alguém sobre um assunto que já martelou, por vezes, minha cabeça...
Cá transcrevo para que vocês possam ler também. Foi a primeira crônica que li no ano. E, ufa, não foi sobre a crise mundial.

Estava autografando meu livro quando uma senhora alta, elegante, já
bem madura, chegou sorridente pra mim e disse: "Te acho uma mulher fenomenal".
Eu, toda sorrisos, tomei o livro que ela tinha em mãos e me preparei para
escrever uma dedicatória bem carinhosa. Ela então complementou: "Mas eu não
queria ser casada contigo - tu és muito independente!"
Concluí a dedicatória, agradeci a gentil presença dela, enquanto que
meu coração começou a bater de forma um pouco mais lenta. O que estou sentindo?
perguntei a mim mesma, em silêncio. Tristeza, respondi a mim mesma, em silêncio,
enquanto a próxima pessoa da fila se aproximava. Em que eu seria mais
independente do que qualquer outra mulher? Quase todas as que conheço trabalham,
ganham seu próprio sustento, defendem suas opiniões e votam em seus próprios
candidatos. Algumas não gostam de ir ao cinema sozinha, já eu não me importo.
Poucas moraram sozinhas antes de casar, eu morei. Quase nenhuma, que eu lembre,
viajou sozinha, eu já. E nisso consta toda minha independência, o que não
meparece suficiente para assustar ninguém.
Fico imaginando que essa
tal "mulher independente", aos olhos dos outros, pareça ser uma pessoa que nunca
precise de ninguém, que nunca peça apoio, que jamais chore, que não tenha
dúvidas, que não valorize um cafuné. Enfim, um bloco de cimento.

Quando eu comecei a ter idade pra sonhar com independência, passei a ler
afoitamente os livros de Marina Colasanti - foram eles que me ensinaram a
importância de abrir mão de tutelas e a se colocar na vida com uma postura
própria, autônoma, mas nem por isso menos amorosa e sensível. Independência nada
mais é do que ter poder de escolha. Conceder-se a liberdade de ir e vir,
atendendo suas necessidades e vontades próprias, mas sem dispensar a magia de se
viver um grande amor. Independência não é sinônimo de solidão. É sinônimo de
honestidade: estou onde quero, com quem quero, porque quero.
Sobre a
questão da independência afugentar os homens, Marina Colasanti brincava: "Se
isso for verdade, então ficarão longe de nós os competitivos, os que sonham com
mulheres submissas, os que não são muito seguros de si. Que ótima triagem".
Infelizmente, a ameaça que aquela senhora acredita que as
independentes representam não é um pensamento arcaico: no aqui e agora ainda há
quem acredite que ser um bibelô (ou fazer-se de) tem lá suas vantagens. Eu não
vejo quais. Acredito que a independência feminina é estimulante, alegre,
desafiadora, vital, enfim, uma qualidade que promove movimentação e avanço à
sociedade como um todo e aos familiares e amigos em particular.
"Eu preciso de você" talvez seja uma frase que os homens estejam
escutando pouco de nós, e isso talvez lhes esteja fazendo falta. Por outro lado,
nunca o "eu amo você" foi pronunciado com tanta verdade.

Martha Medeiros.

PS.: Um feliz ano novo para todos nós !